30.11.07

João, o que queres ser quando fores grande?

Eu quero ser astronauta e ir à lua.
Eu vi o filme do ET e eu gosto muito do ET, ele era simpatico e tinha dedos como nós, por isso eu podia jogar x-box com ele. Eu sei que vou ser astronauta porque quando era pequeno fui à Eurodisney, andei na montanha russa e nao vomitei e nao fechei os olhos. Eu sou mais valente que o andré da minha turma, mas ele joga futebol melhor que eu e tem namorada. Eu nao gosto do andré, ele é estupido e goza comigo porque eu tenho oculos. Eu nao lhe chamo nomes mas sei que vou ser astronauta e vou aparecer na televisão com o ET e ele nao. Por isso, eu sou mais fixe.

A Mariana andava com cara de caso, com cara de gato guloso...

Eram já 3 da madrugada e ainda ela passaricava por toda a casa em pezinhos de lã. A porta dos pais estava fechada à chave, quando isso acontecia era porque eles estavam ocupados, muito ocupados e só sairiam na manhã seguinte, com grandes olheiras. A Mariana podia ser pequena, mas sabia muito bem o que faziam eles.

A Mariana era uma criancinha cruel: tinha baptizado o seu gato de peluche com o nome Rato. Fazia questão de chamar-lhe sempre Rato! Vamos admitir... a Mariana era uma humilhadora!

À noite, a Mariana ia ao jardim e trazia bichinhos de todas as espécies. Ela gostava especialmente de lesmas, verdes, lentas e viscosas, trazia-as no bolso do seu vestido, para dentro de casa. Era certo que elas babavam-se muito mas isso não lhe importava...

A Mariana não gostava de sopa, recusava-se a comê-la por isso os pais obrigavam-na a comer espinafres. Para além de humilhadora, a Mariana era vingativa!
Ela tinha um pequeno almofariz que, um dia, havia roubado de uma qualquer loja de decoração. Adorava aquele pequeno pote, sentava-se à sua frente e fazia um olhar maléfico, como se fosse uma feiticeira amaldiçoada! Pegava em todos os bichos e nas suas adoradas lesmas e esmagava-os, sem dó nem piedade, liquido viscoso esguichava por todo lado, um liquido verde e mal-cheiroso tão parecido com sopa...
Sim, a Mariana era má!

No jantar do dia seguinte, a Mariana ocmia espinafres verdes com natas e sorria. Sorria, num esgar de ódio, enquanto os pais comiam a sopa.

29.11.07

O céu hoje estava limpo, sem nuvens ondulantes que assustassem os loucos pela meteorologia. As pessoas puderam usar sapatos de tecido, as mulheres pavonearam-se em saias e os homens puderam mostrar os pelos do peito sem ficarem com os mamilos tesos.

Hoje teve um dia realmente bonito mas, para minha grande pena, não ouvi os pássaros. Não vou dizer que eles em silencio estão a conspirar contra a espécie humana e a qualquer momento irão abater-se sobre nós como misseis cobertos de penas, tal como no filme. Não vou dizer isso, não... suponho que estivessem apenas ocupados a comerem outros animais, a cagarem na relva e nas cabeças das pessoas, tudo isto para manter a sanidade do nosso ecossistema.

Hoje estava um dia mesmo bonito.

25.11.07

Eu, Ana Sophia, estou apaixonada!

<3 Heima, um filme de Sigur Ros

"Eu tinha lido que se suicidavam muito mais pessoas no dia de Natal e no dia seguinte do que em qualquer outra altura. Aparentemente esta festa pouco ou nada tinha a ver com o nascimento de Cristo."

- Mulheres, de Charles Bukowski

24.11.07

21.11.07

Tudo por Titus...



"As pedras têm as suas vozes tal como as penas dos pássaros; a ira dos espinhos, os espíritos feridos, as armações dos veados, as costelas que se encurvam, o pão, as lágrimas e as agulhas. Os pesados pedregulhos e o silêncio dos frios pauis - têm as suas vozes - as nuvens insurgentes, os galispos e os vermes. Vozes que trituram a noite vindas de pulmões de granito. Os pulmões de ar azul os pulmões brancos dos rios. Todas essas vozes assombram os momentos de todos os dias; todas essas vozes preenchem as fendas de todas as regiões. Vozes que ele ouvirá, quando escutar, e quando os seus ouvidos estiverem atentos a Gormenghast, cujo falar será o infinito dos infinitos. Este é o som ancestral que ele terá de continuar, a voz das pedras amontoadas em torrões cinzentos até que ele morra entre a torre-mortal dos Groan. E estandartes serão arrancados então das ameias e paredes, e ele será levado para a Torre das Torres para jazer entre os despojos dos seus antepassados."

in Titus, O Herdeiro De Gormenghast

20.11.07

Testemunho de uma "cigana"

Desde que me conheço por gente que levo vida de cigana, mas nunca o fui. Lembro-me de nós como uns apaixonados pelo mundo, mas mais do que isso, apaixonados uns pelos outros.
Sempre que chegávamos a 23 de Agosto, arrumávamos tudo na carrinha e lá íamos nós, com um mapa na mão e um destino já traçado. Acho que nos habituamos aquela vida itinerante. Quando chegávamos a um lugar já estávamos a pensar no próximo. Era viciante!
No dia em que os deixei para trás, o meu irmão Frederick era ainda um rapazinho e eu tinha acabado de atingir a maioridade. Apaixonei-me por um norueguês de barba loira. A Anika, a minha irmã, nunca vai abandonar a minha mãe. Não a acho capaz de se entregar a mais nada ou ninguém para além daquele vicio.
Sempre achei a minha mãe muito bonita. Nas minhas primeiras crises existenciais lamentei não ter saído a ela. Nasci ruiva e com o corpo coberto de sardas, enquanto que ela (dizem) é parecida à Agnetha Fältskag.
Tinha 13 anos quando a minha mãe me explicou, de forma adulta, o que era o amor e quando aprendi que “jag älskar dig” em francês é “je t’aime”. Na altura podia jurar que aquele meu primeiro “je t’aime” ia ser para sempre, mas agora tenho um lar e não sei se algum dia vou querer voltar a ser “cigana”. Sei que se não achasse que valia a pena deixá-los não o tinha feito, mas agora passo meses sem saber se a Anika e a minha mãe estão bem e por onde anda o Frederick… São longos períodos à espera de noticias deles e essa é a parte mais difícil.
O meu cabelo já não é tão ruivo, mas as sardas nunca desapareceram e nunca chegamos a ir a Marrocos. A verdade é que eu não guardo más recordações da vida de andarilho e custa-me pensar que um dia posso acordar arrependida e a desejar o “23 de Agosto”.
Eu vou ser sempre uma Nilson, só que a Nilson que foi num cruzeiro pelos Fiordes e não voltou mais.
Às vezes pergunto-me se foi um erro, se vou deixar de ser feliz só porque parei de viajar. A Anika costumava dizer que “ser feliz é conhecer o mundo”, mas eu quero acreditar que posso ser feliz aqui.



Take You On A Cruise - Interpol

"(...)We sail today, tears drown in in the wake of delight
There's nothing like this built today
You'll never see a finer ship in your life
Along the way the seas will crowd us with lovers at night
There's nothing like this built today
You'll never see a finer ship or receive a better tip in your life
(...)
Oh my love we're sailing to Norway"

19.11.07



Não te preocupes Ivan. Não vou fazer disto cartazes. 8)



Foi num dia bonito, de céu enublado que o mar me levou para longe.


Lá estava eu, na areia, com os meus enrugados pés descalços, a sentir a areia fininha debaixo dos meus calos, de mãos dadas com o Tomé. Aquecíamos as mãos um ao outro, esfregando-as muito devagar não fosse a nossa pele quebrar-se. As ondas ao longe convidavam-nos a fechar os olhos e eu aceitei o convite. A luz escondida passava pelas minhas pálpebras e vi tudo claro, nuances de azul e cinzento... Senti a minha boca a formar um sorriso e pensei no Tomé, no belo Tomé com quem havia casado há tantos anos. Era isto com que tinha sonhado há muito muito tempo quando lhe disse que seria com ele que queria morrer, assim de mãos dadas.
O vento soprava-me os frágeis cabelos para trás e arrepiava a reluzente carequinha do Tomé. Abri os olhos e olhei para ele. Debaixo das rugas, via-lhe a beleza, todos os dias olhava assim para ele, lembrando-me do quanto o amava. Ele retribui-me o olhar e senti-me aconchegada por braços invisíveis.

Não dissemos uma única palavra todo o dia, falávamos por sorrisos e gestos, os sons já eram desnecessários. Os nosso corações batiam à mesma velocidade e isso as pessoas novas não sentem. Senti-me tão feliz ali, em frente ao azul infinito e voltei a fechar os olhos. Estava preparada para partir. Apertei ao de leve a mão do Tomé e deixei que o mar me levasse para junto de Deus.

Olá Estranho! (Um texto de Ana Carvas)

Uma questão várias vezes colocada (principalmente por pessoas que viveram no estrangeiro) é: como meter conversa com um desconhecido em Portugal. A verdade é que, por aqui, há a mania de só se falar com o amigo do amigo.

Com excepção dos amantes dos chats ou outros meios de engate virtuais, quase todos os outros portugueses sentem dificuldades em conhecer pessoas fora dos seus meios. A maioria das mulheres abordadas olham de forma quase ofendida para o atrevido que teve a lata de meter conversa. Por outro lado, a maioria dos homens abordados têm a tendência a desconsiderar as meninas que ousem tal peripécia. Com excepção, claro, para as meninas que estão muito acima das suas possibilidades (tipo uma modelo linda de morrer, com pernas de metro e meio).

Se isto se passa neste nosso jardim à beira-mar (tão bem) plantado, o mesmo não se passa na maioria dos outros países desenvolvidos. Experimentem um bar em Londres ou Nova Iorque e verão a diferença.

Por isso, meus amigos, aqui fica o meu repto: misturem-se! conversem com estranhos! não se sintam ofendidos por alguém vos achar suficientemente interessantes! Há algo melhor do que conhecer pessoas novas e realidades novas?

18.11.07

13.11.07

Tens um buraquinho no vestido por onde gosto de espreitar. quando o vestes, as vezes vejo-te o mamilo esquerdo, mas quando o puxas ligeiramente para cima, vejo-te o coração. Sao raros os dias em que o fazes, mas essas raras vezes valem por todos os outros momentos em que nao usas o vestido do buraquinho.

deixas-me ver os teus ventrilocos e auriculas, que bombeiam esse sangue que te mantêm viva. sao todos de um vermelho vivo, das mesmas cores das tuas quentes entranhas.
gostaria de lhes fazer uma prece, uma prece para que um dia eles trabalhariam tambem para mim. mas para ja nao passo de um pequeno observador.

um pequenino voyeur.

E lá estava o diamante, no topo de um monte de ossos.

só por cima do meu cadáver!, disseram eles.

Nem por um segundo quis desobedecer-lhes.

11.11.07

foi uma pérola que caiu no chão, órfã do pescoço onde repousava levemente. era uma pequenina pérola, disforme, que teimava em não rolar direito. rolou tão torto que acabou na sarjeta.
e a pequena pérola viu-se na sujidade e escuridão do esgoto, pequeno ponto branco no meio do imundo. se naquele momento olhássemos para dentro da sarjeta era como se estivéssemos a olhar para uma noite de luar.

mas depois vieram as ratazanas, titãs de dentes mutantes, cheiravam a podre!
viram a encantadora pérola e atacaram-na num pulo. ela acabou no estômago de um daqueles monstros, viajando para os intestinos e consequentemente entupindo todo o sistema excretor da ratazana. ela morreu em grande agonia enquanto a pequena pérola continuava branca e imune. A ratazana começou a decompor-se e acabou sendo devorada pelas suas queridas conterrâneas.
No meio destas reles canibais, uma mais destemida cometeu a estupidez de engolir a pérola. e pimbas, também ela morreu. Todas elas passaram pelo mesmo e toda a colónia acabou por definhar.

A pérola ficou ali sozinha durante dias e dias até que um dia, um amoroso rato pegou nela e levou-a dali para a fora, para o aconchego de uma qualquer parede de estuque.

Não sei que mais lhe aconteceu, mas suspeito, oh sim SUSPEITO, que também ela tenha matado o pobre do gato.

10.11.07




cheguei a casa com um sorriso. A sala estava a meia-luz, pousei a pasta num canto perto da porta e entrei na sala. Lá estava ele, com um de copo whisky na mão, a ouvir musica. olhei para ele e tirei o casaco. queria tanto tocá-lo e sentir-lhe o calor. Havia gaivotas na musica e desejei o mar, a praia, a areia dourada. Quis pequeno-almoço à beira mar... Mas isso seria num outro dia. Agora tinha-o só para mim na sala.

Pôs-me a mão em volta da anca e começamos a dançar muito lentamente, era a dança do amor, dois índios que desejavam a chuva dourada. dançamos de olhos fechados, senti tanto a mão dele. Bebemos até perder a conta, era tudo quente ali, a minha face ardia de desejo, nao aguentei mais e deitei-me no chão, braços esticados, contra o chão frio e pernas flectidas. Levantei ligeiramente o vestido, ele ajoelhou-se e passou a mão pela minha perna. desceu desceu em direcção ao meu pé e beijou-o.

Foi o primeiro beijo naquela noite.

3.11.07

Tip of the Day:

Num sábado à noite, sozinhos em casa, não se ponham a ouvir Buddy Holly.


"oooh... Children, Buddy Holly is dead and there's nothing that me or you can do about it.
I said!, Buddy Holly is dead and there aint nothing you can do about it."

O outro lado de Wisconsin

2.11.07

2

Quarta-feira 18


O Homem de Negócios já se foi, foi-se no dia 15. Era domingo, o primeiro dia da semana.

Voltei ao sonambulismo temporal.
Hoje não fui ao chinês, fiquei-me por uma barraca na berma da estrada. Peguei no carro e fui conduzir pela auto-estrada fora, em silêncio. Não quis ligar o rádio, irrita-me o modo pausado como os locutores falam, como repetem as mesmas palavras para encher o tempo até um bip estúpido marcar as 2h da manhã.

Decidi andar de carro para pensar claro, não consigo pensar em casa, faz-me chorar a mais e pensar a menos. Custou-me vê-lo a partir pela manhã, fui com ele até ao aeroporto. Sem querer, ele esventrou-me, tirou-me o coração para fora e fui obrigada a enfrentá-lo. Tinha trabalhado durante muito tempo para o fechar numa jaula e alimentá-lo o menos possível, fazer dele um anoréctico coração. Mas agora tudo isso pareceu ter sido em vão.
Pensei em sair do carro, sem o parar e atirar-me para a berma da estrada e ficar ali. Mas não o fiz, se há algo que não sou é suicida. Recuso-me sequer a pensar nisso. Eu criei-me, inventei-me. Não sou um simples fruto da natureza, desprendi-me de tudo o que conhecia e vim para aqui.
Não me vou desperdiçar só por causa de um homem.

Para quem anda de dieta:

Desserts (1998)


- Que dizes?
- Nada.

1

Sexta-feira 13

Não, não é um dia de azar. É um dia como todos os outros: comi sushi barato num restaurante chinês num beco de uma rua onde as putas mandam à noite. Sei que poderia ser uma delas mas hoje, oh hoje, as coisas foram diferentes.
Fui sair com o Homem de Negócios à tarde, vem cá uma vez por estação. É ele que me diz que o tempo passa; cheguei a um ponto em que tudo é igual, o sol nasce e põe-se todos os dias. Qual é a piada? sei que as cores mudam no céu durante o pôr-do-sol mas e se eu vos disser que sou daltónica? Sim, eu sei, estaria a mentir.
Fomos passear, ele levou-me às compras, comprei sapatos e lingerie. Ele sempre me deixa ser mulher, seduz-me por entre as cortinas dos vestuários e faz tudo isto como se de um afrodisíaco se tratasse. Depois leva-me para o quarto de hotel, onde fazemos amor, de janelas fechadas, apenas com a luz da cabeceira ligada. Sempre que está comigo, escolhe quartos com muitos espelhos. Ele sabe que eu gosto de ver, ver acima de tocar.
Quando acabamos, fumo um cigarro, nua, em frente à janela. Entretanto ele vai tomar banho, acho que nao quer que o meu cheiro se lhe entranhe na pele, lhe penetre os poros e que o seu coração o respire. Eu percebo. Não sou mulher para ele, não sou mulher para ninguém. Demasiado fria para aquecer quem quer que seja.
Esperei por ele na cama, ele veio e sentou-se no cadeirão, tão distante. Levantei-me e deitei-me a seus pés. senti a alcatifa nas minhas costas e as suas mãos nos meus cabelos. Puxou-os levemente como se me desejasse, mas logo os largou virando a cara para a janela. Eu sei que ele ama outra mulher, num outro lugar do mundo. Achei melhor deixá-lo sozinho, não me quero intrometer. Vesti-me e, à porta do quarto, beijou-me a face, dando-me a mão. Olhamo-nos nos olhos e vi-lhe o coração pela primeira vez. Vi uma tamanha tristeza que me gelou o corpo. Não fui capaz de lhe tocar, desci no elevador e comecei a chorar. Pela primeira vez, em anos, senti. Parei o elevador, não podia descer mais. Corri de volta ao quarto e tomei-o nos meus braços. De repente senti-o a soluçar, com o peito encostado na minha cara, foi um alivio tremendo. Ali, ambos sentíamos com o coração e não com o corpo.
Mais uma vez, deitamo-nos na cama e despimo-nos, por entre os lençóis, mas não fizemos amor. Foi só um desejo de toque, de calor. Não olhei para os espelhos e não liguei a luz. Queria tudo tão negro para que a cegueira se tornasse completa.
Não sei quanto tempo assim ficámos mas o calor foi mais intenso que nunca.